Um dos filmes que mais marcou a minha adolescência e, até, maneira de andar (não perguntem), foi a fábula pastiche futurista de Paul Verohoven, Robocop.
A adolescência é uma altura tramada, em que as hormonas nos dão cabo do sistema, somos extremamente influenciáveis e desenvolvemos uma capacidade absolutamente insuspeita de fazer merda e em grande.
No caso, a procura de identidade.
É um mito, um Santo Graal recorrente esta trampa de andarmos em busca do nosso eu.
Como toda a gente sabe, a nossa identidade está no BI.
Todas as demais variações de qualquer dúvida que possamos ter em relação a nós próprios caem nos domínios ou da fantasia ou do foro patológico; o que acontece é que muitas vezes não gostamos daquilo que somos ou, pior, queremos ser como outra pessoa qualquer e, por qualquer razão, falta-nos a força ou vontade de sermos nós próprios, escolhendo a opção sempre fácil da desresponsabilização e do alheamento, projectando a nossa atenção, interesse e, eventualmente, justificação para fora de nós, nos outros.
Não dá, é escusado: ou se cai na real ou se procura tratamento profissional (leia-se neurologista, psicólogo ou psiquiatra, *não* aquelas fantochadas burlescas new age tipo astrologias, conversas com deus ou o catano - reparem no requinte de malvadez ao escrever a palavra divina com minúscula: estou *tão* condenado ao fogo eterno) - Somos quem somos e o que fizemos, temos mais é que nos orientar, aproveitar e rentabilizar.
Isto tudo a propósito da cena em que o cibernético outrora (ao fim e ao cabo, ainda) Alex Murphy recolhe do computador informações sobre a sua identidade humana, é confrontado com a sua própria morte e, ao mesmo tempo, recorda cenas da vida passada: pequenos instantes como brincadeiras banais com o filho, palavras trocadas com a mulher... Enfim, todos aqueles momentos a que não ligamos e só lhes damos o devido valor quando os já não podemos ter - aquela viagem que o cyborg faz ao passado, à casa onde então fora feliz (ou, no mínimo, humano) é absolutamente antológica, com o granulado da imagem nas transições entre as memórias digitalizadas e as cenas reais, redescobrindo a sua vida, sendo assim aquela réstea humana atirada impiedosamente para a fria constatação da desolação da realidade. Um mimo.
Por isso, é aproveitar que isto não dura sempre.
Como dizia Roy Batty no final do seu período de vida ao Blade Runner Rick Deckard: all those moments, lost, in time, like tears... in rain.
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